"Qualidade de vida..." foi um post que produziu opiniões diversas. Agradeço todos os comentários, os que concordaram e os que discordaram. Mas teve um, em especial, que achei interessante publicar como complemento, por ter sido escrito por alguém que conheço pessoalmente, dando um relato sobre a doença grave de sua mãe e que nos faz ter uma noção da questão de uma forma mais ampla. Sei que é chato ler post grande, mas vale a pena conferir:
Bem, presencio uma situação dessas aqui em casa. Houve tempos em que minha mãe queria morrer pra não dar trabalho e tbm pq é terrível um dia vc ser uma pessoa ativa e na moda e no outro estar presa em uma cadeira de rodas, sabendo que chegará o dia em que ficará de cama. No entanto o Universo sempre nos prepara surpresas e ela teve que aprender a lidar com a doença e com a situação que esta vivendo. Ela não fica refletindo sobre isso, pelo menos não expressa isso, mas sinto que o referencial de felicidade para ela hoje em dia é algo completamente fora do que eu possa pensar. Os referenciais dela são completamente diferentes dos meus.
Pra ser sincera, acredito que essas pessoas citadas tenham momentos felizes... e ninguém vai dizer pras câmeras o contrário. Devem existir momentos felizes (pra todos é assim), mas deve ser muito triste na solidão. Nosso Brasil exclui qualquer tipo de deficiência e as pessoas tendem a excluir qualquer tipo de diferença, sendo assim, viver em situações como essas é algo como uma luta cármica, na minha visão... sei lá, tem algum aprendizado, lógico, e no final você tem que se aceitar e aprender a viver feliz com isso, pois não há escapatória... ou você fica feliz assim ou entra em profunda depressão e piora ainda mais sua qualidade de vida, pois ninguém gosta de lidar com depressivos ou pessoas infelizes (tai os casos de famílias que abandonam e "acompanhantes" que espancam, maltratam, etc, seus clientes idosos e/ou com algum tipo de deficiência).
Aliás, esse conceito de qualidade de vida pode ser muito amplo... por exemplo, no caso daqui qualidade de vida é ela conseguir estar em casa, que é onde ela se sente segura, com as pessoas queridas, sendo bem tratada, alimentada e podendo assistir aos programas que a distraem sem dor, sabendo o que esta acontecendo na sua realidade (quem chegou, quem saiu, porque saiu ou chegou). Falta de qualidade de vida é ficar no hospital sendo tratada por aqueles animais que se dizem médicos e enfermeiros (nem todos, mas uma grande parte), que a fazem sentir dor e a tratam como lixo humano, naquele ambiente estéril.A fazem "apagar" simplesmente pq não querem ter trabalho, ou a deixam suja pq estão com preguiça ou sem saco de ir lá trocar (pois é algo trabalhoso, que requer cuidados), o que resulta em vários machucados e uma piora na condição dela.
Isso sim é falta de qualidade de vida... aliás, isso é falta de humanidade... mas não se pode esperar muito dessa humanidade que vive por aqui...
Gosto de pensar que tudo tende ao equilíbrio... então... nada acontece ao acaso... ninguém está livre de ser o próximo a ter que viver uma situação dessas... no final, todo mundo recebe aquilo que pode carregar.
P.S. tenho consciência também que se a medicina não estivesse como esta, nem ela e nem eu estariamos vivas... então, repetindo, nada é por acaso e cada um recebe aquilo que pode carregar e precisa aprender a lidar... por caminhos tortuosos e dolorosos ou não.
Já pensei inúmeras vezes que era melhor ela morrer. Não que não goste dela, pelo contrário, nos momentos em que ela ficou internada era um silêncio apavorante e profundo por aqui, uma sensação de vazio físico e espiritual... Mas sinceramente, quando você vê o outro todo ferrado sendo tratado super mal e você não pode fazer nada... é frustrante e doloroso. Você pensa SIM que a morte seria muito melhor para cessar o sofrimento dela e dos que convivem com ela. Ela já expressou isso no passado e foi criticada pela minha avó, ultra conservadora-católica-cristã.
É muito bonito e cristão pensar que "oh, como é bom ela viver, mesmo que esteja completamente f****a e piorando!"
Ver alguém que você ama numa CTI sendo IGNORADA pelos que trabalham lá enquanto sufoca, vermelha, com os olhos esbugalhados, engasgada e sem ar... por sorte você está lá pq é horário de visita, após algum estresse eles vão lá atender a pobre sufocada. Você vê que aquilo provavelmente esta se repentindo há algum tempo, pois a pessoa sufocada procura seus olhos (quando vc convive com alguém assim você aprende a ler seus pensamentos)e te olha com desespero e, quando pode, pede pra sair de lá... e você não pode fazer nada, pois se ela sair de lá com certeza irá morrer em casa e você receberá um lindo e fantástico processo judicial por omissão de socorro, ou homicídio, já que você a retirou do hospital.
Fala sério, vc depende da boa vontade dos outros...muito bonito e cristão dizer "eu não ligo ou eu não vejo problema; ficaria muito feliz que a pessoa não morresse". Vive a experiência pra ver como é lindo e maravilhoso... as pessoas vão se afastando na medida que a doença vai piorando e o enfermo vai se tornando mais incapaz e dependente, pois as pessoas não desejam ser aquelas que "terão que cuidar" e somem MESMO. Claro que restam alguns e esses fazem a felicidade do enfermo, mas quem convive vê... as pessoas não sabem lidar e se afastam... o país não te acolhe, tudo é dificultado...
Já pensei várias vezes que se eu tbm tiver a doença prefiro morrer... até pq sei que tudo é incerto nessa doença... e não tenho tanta certeza que teria alguém comigo como meu pai faz com minha mãe. Além do que, esse apego cristão à vida é extremamente estranho. Ok, legal viver, uma experiência única, já que esse é o único planeta no momento em que podemos experimentar a vida dessa forma, mas esse medo da morte, esse apego... putz... essa regressão pós cristianismo... ai ai.
Mas já aprendi que nem tudo vai pelo caminho mais fácil ou que eu acredite ser melhor...
**** beijos de novo!
Nota: agora ela esta bem e em casa, como disse no comentário anterior. Agora inclusive ela tem dado retorno e não tenho mais pensado em morte pq vejo que ela gosta de viver, de controlar o pequeno mundo a seu redor... e tbm pq espiritualmente acredito que ela está tendo um desenvolvimento profundo e uma ascensão fantástica, que já vem de outras vidas.Eu mesma já mudei minha visão sobre o mundo, pelo paradigma espiritual.
Antes que seja linchada pelos cristãos presentes, nada contra nenhuma religião ou forma de pensamento. Citei episódios recentes e reais, mas nada nesse mundo é fixo, cada um pensa como quer e reage ao mundo ao seu redor de sua forma individual... nem tudo é igual e nem todos experimentam os fatos da mesma maneira. Claro que cada caso é um caso e tudo mais... respeito a todos os pensamentos divergentes dos meus, por mais que me expresse de forma exagerada e enfática não acredito que esteja certa sobre nada... é minha visão que estou compartilhando e só.
(Jura Secreta)
terça-feira, 6 de maio de 2008
Qualidade de vida... (o complemento)
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caramba que post e que história!!!
ResponderExcluirQuerida tem promoção nova no meu blog, gostaria que participasse.
Realmente, o olhar sobre a mesma situação varia de acordo com a realidade vivida.
ResponderExcluirEsse post foi, digamos assim, animador, pois no fim das contas, mesmo após todo o sofrimento, a pessoa que estava doente conseguiu melhora e tal. Mas eu, do fim de 2006 até o meio do ano de 2007, vivi praticamente um pesadelo.
Em outubro de 2006 meu avô sofreu um acidente em casa e precisou ir pro hospital. Ele fraturou o fêmur.
Sendo que esta queda foi o que desencadeou seu sofrimento até que ele viesse a falecer.
Desde outubro/2006 eu ficava com ele no hospital quase todos os dias, pois ele não podia ficar sozinho. Inclusive eu perdi muitas aulas no colégio e deixei de estudar pro vestibular, mas fui eu quem me ofereci para ser a acompanhante dele, visto que praticamente ninguém da família tinha como ficar com ele durante tanto tempo. Eu permanecia ao seu lado das 6 da manhã até as 7 da noite. Daí chegava algum outro parente para me substituir nesse período da madrugada.
A questão é: de outubro/2006 até maio/2007 eu vi meu avô definhando.
E percebia o quanto ele estava triste pois sempre gostou e enfatizou o quanto prezava por sua independência. E de repente ele precisava de outra pessoa para o alimentar e o levar até o banheiro.
Certo momento, quando ele já estava em casa (com certeza porque os médicos sabiam que não tinham mais jeito e pretendiam desocupar leitos, pois definitivamente ele não tinha condições de sair do hospital), na hora em que minha tia estava dando comida a ele, ele falou: "Para de me alimentar."
Sabe, foi cortante pra mim ver aquela cena e saber o quanto ele estava sofrendo. Lembrar de como sempre foi meu avô e de repente vê-lo definhar em cima de uma cama.
Os últimos meses foram os piores. Ele ficou praticamente cego e não conseguia mais falar. Ele estava consciente, preso dentro do seu próprio corpo, sem ao menos conseguir se expressar.
Até que um dia ele teve uma piora significativa, precisou retornar ao hospital e em pouquíssimo tempo depois veio a falecer.
Ou seja, nessa situação, nem o apoio da família foi o suficiente para melhorar sua qualidade de vida. Claro que eu sei que se ele estivesse jogado num leito de hospital tudo teria sido muito pior. Mas vê-lo sofrer, pedindo pra morrer, dizendo que não aguentava mais dar trabalho a todos e que era um peso morto, eu me revoltei com aquilo. Me revoltei com o destino, com Deus, com o Diabo, nem sei. Me revoltei pois achei injusto aqueles meses de sofrimento. Achei injusto como tudo aconteceu. E sinceramente, não acredito que ele conseguiu qualquer tipo de qualidade de vida. Pois eu presenciei o quanto ele desejava morrer, o quanto ele não queria estar mais ali. E só eu sei o quanto eu desejei que ele morresse, pois eu não conseguia suportar ver alguém que eu tanto amava, que cuidou de mim como um pai durante minha infância, sofrendo de uma maneira inimaginável durante tanto tempo.
Desculpa o desabafo, mas era só pra enfatizar que todo ponto de vista sempre depende da situação. Rs
Beijo.
Um texto-lição de humanidade e respeito pela dor, que é de todos nós.
ResponderExcluirQuanto aos cristãos, viva os leões do Coliseu, como disse Sartre:"Deus é a solidão dos homens"
Viva Baco e as bacantes.
beijo
Realmente cada um encara a vida da sua forma particular.
ResponderExcluirCada um reage segundo os seus princípios e conceitos que são mutáveis sempre.
Errar é parte do aprendizado, só não vale desistir e querer morrer....
Um relato e tanto esse da sua amiga, realmente belo.
Beijos
Desde o inicio do texto eu pensava "acho que vou comentar 'assim e assimm..'... e logo surgiu a frase q eu procurava:
ResponderExcluirmas nada nesse mundo é fixo, cada um pensa como quer e reage ao mundo ao seu redor de sua forma individual... nem tudo é igual e nem todos experimentam os fatos da mesma maneira. Claro que cada caso é um caso
beijossssssss
Realmente... fico muito impressionado.
ResponderExcluirQue post bacana e que história forte.
Aí, que história ...
ResponderExcluir_
Te senti meio tristinha no seu último comentário! =(
Sempre te vejo alegre, com o seu Q.E sem alto ... eu sei que todos nós temos direito de dias péssimos ... só tõ querendo dizer que pode contar comigo! Se eu puder ajudar em algo ... estamos aí!
Beijos, querida!
É, ninguém melhor do que quem convive com a situação pra dizer como as coisas realmente funcionam...
ResponderExcluirBeijo.
Concordo que é tudo relativo, depende do ponto de vista. Só quem está sentindo na pele a situação que pode falar...
ResponderExcluir:*
A visão de felicidade dela e de qualidade de vida, era estar em casa, segura, lógico, depois de passar pelo sofrimento de decidir se dejesa encarar a vida que foi imposta para ela, ou simplesmente fugir. Como eu tinha falado, a qualidade de vida está diretamente relacionada do que a pessoa deseja para si, se pessoa tem algo grave e quiser fazer disso um transtorno maior ainda, ela vai cair em eterna depressão (como a colega do texto falou), ou ela encara de forma realista os fatos, sabendo que ela pode encontrar condições viaveis para uma vida mais confortavel.
ResponderExcluirMas é aquilo, ninguém gosta de ver um ente querido sofrer, passar por um monte de sessões de tortura, ninguém gosta, a melhor saida é lutar ou se entregar, eu prefiro lutar!
beijos Dama!!
Muitas pessoas tendem a direcionar o que é bom para vc... importando costumes e conceitos de qualidade de vida... isso mexe com nossa cabeça de terceiro mundo...
ResponderExcluirMas aposto muito na questão do bem estar... equilibrio..fundamental.
TEmos de enfrentar a vida com o nosso olhar erguido e orgulhoso de nós mesmos. Parabéns.
ResponderExcluira vida se manifestando de diversas formas e afetos. instigante e sensível posts. a vida real. abraços.
ResponderExcluirOlá querida.!
ResponderExcluirTava blogando por ai e te acheii,
nossa que post marcante hein.!
Posso dizer que já presenciei uma situação semelhante a essa em minha vida...
Pois meu avô (agora falecido), sofreu muito por causa de uma doença chamada "alcoolismo" muito torcem o nariz dizendo que isso é uma opção, mas não é mesmo.! é uma doença... umas das piores na minha opinião, pois geralmente o paciente não quer se curar, e acaba agravando com o tempo e a velhice.
Quantas vezes já nos deparamos com algum "bêbado" pelas ruas, caido pelas calçadas sei lá? Realmente isso causa uma certa repulsa, eu mesma já torci o nariz pra situação, mas hj eu vejo isso diferente "poderia ser o meu avô". Essa pessoa caida pelo chão tem uma familia q nesse momento pode estar aflita por não saber onde ele esta.
Meu avô morreu por causa de doenças desencadeadas da bebida, mas antes disso acontecer toda a nossa familia sofreu junto com ele (pelos sumiços, pelas clinicas de tratamento forçado contra o alcoolismo, pelas crises de saúde, etc).
É triste dizer, mas infelizmente falta humanidade, companherismo, e gratidão por nossos idosos nesse mundo em que vivemos, ninguém pensa q amanhã seremos os próximos.!
Noooossa vou terminando por aqui, se não daqui a pouco isso vira um post e não um comentário, rsrs
beeijo.. té +
li o post anterior (aliás, vc escreve mto bem) e me remeti a este aqui. São questões q eu nunca vivi na pele, mas estou com vc na opinião do post anterior. Não sei até q ponto podemos ficar apenas tristes, sem nos revoltar, tipo quem crê em Deus se revoltaria contra Deus, admiro quem acha q nada é por acaso, mas eu não seria otimista nestes casos. Pode até parecer fraqueza, como diria lulu santos, pois q seja fraqueza então..
ResponderExcluirbeijos
Tocante mesmo e concordo com sua opinião. Cada um sabe onde o sapato aperta mais, naum julgo pessoa que desejam a propria morte, mas é bom saber q a vida naum é um videogame com um botão de resert.
ResponderExcluirEu tinha lido o comentário... foi o complemento ideal!!
ResponderExcluirBeijos!!