domingo, 28 de abril de 2013

Que não me ama, não me merece!



Por conta da questão da transexualidade, passei boa parte da minha vida me interessando por homens que jamais olhariam para mim e pior, sofrendo muito por conta disso. Depois que fiz a transformação do meu corpo, passei um tempo curto sofrendo por homens que não me aceitavam como mulher. Ainda bem que já faz alguns anos que consegui esfriar meus sentimentos a ponto de deixar de me interessar por homens que não se interessam por mim. Acho que isso foi uma espécie de defesa da minha mente, não foi algo que programei, que lutei para isso, simplesmente foi acontecendo e que bom que aconteceu.

Mas ao acontecer isso na esfera dos relacionamentos amorosos, a coisa transbordou para todas as áreas da minha vida e fiquei meio fria mesmo. Não diria que me tornei uma pessoa insensível, perversa, amarga nada nessa linha, apenas é como se meus sentimentos, minha mente automaticamente procure alguma forma de interesse da outra parte, se essa não existe, simplesmente acontece o desligamento das emoções, seja no amor, nas amizades, nas relações cotidianas.

Para chegar no ponto que estou hoje, posso dizer que arrastei muita corrente sofrendo por homens que não davam a mínima e que até riam do que sentia. Era um sofrimento tão grande que me dá agonia só de lembrar. Sem contar as decepções com amizades, porque me entregava demais, esperava demais e quando as expectativas são altas, geralmente o resultado é a decepção.

Obviamente que tudo isso veio para as relações virtuais. Sempre que identifico qualquer falta de reciprocidade o meu primeiro movimento é o afastamento. É claro que aqui no virtual, como mantemos contato com muita gente, é até natural que algumas relações vão se perdendo de uma forma espontânea, os dois lados vão seguindo caminhos diferentes e quando a gente percebe nem fala mais com aquela pessoa, nem troca uma mensagem, nada. Mas a questão que abordo aqui não é esse afastamento natural que ocorre e sabemos disso. Eu digo sobre aquelas pessoas que a gente procura e a pessoa não te dá retorno, daí minha reação quase imediata é um bom e redondo bloqueio, porque assim como na minha vida "real", na vida virtual não tenho a menor disposição de ficar insistindo, ou tentando impor minha presença, se noto que não tá rolando, nem sofro com isso, ou até sofro, um pouquinho, por uns dias, em alguns poucos casos... rsrs.

No todo, esse meu jeito atual não traz só benefícios como pode parecer. Do tipo que sou uma pessoa fodona que não sofro por causa de relacionamentos, não é isso, tenho meus sofrimentos sim, até com relações que estão rolando bem. Acho que o prejuízo de ficar assim, é que ao esfriar meus sentimentos, também fiquei com uma enorme dificuldade de me apaixonar e isso não sei o tamanho de bom ou ruim que é. É bom quando me protege de amores platônicos e é ruim quando não permite que possibilidades reais se concretizem. De qualquer maneira ainda gosto mais do jeito que sou hoje.

domingo, 21 de abril de 2013

A família X sensação de felicidade...

Exatamente por não ter tido apoio da minha família, ou um apoio truncado em algumas épocas da minha vida, do tipo quando eles percebiam a possibilidade de que eu pudesse me transformar no modelo que eles esperavam e não eu mesma, é que comecei a analisar no decorrer da minha vida a influência da família na nossa sensação de bem estar, e digo que tem toda a relação com isso. Pessoas que tiveram uma família mais bem estruturada, com apoio, respeito e incentivo, são pessoas mais felizes no geral. Faça um exercício rápido e pense nas pessoas que você acha feliz e as que acha infeliz e suas respectivas famílias. Claro, gente, que se tratando de ser humano tem sempre as exceções, nada é tão matemático.

Quando era percebida apenas como homossexual, minha família até tolerava, com muitas ressalvas, sem nenhuma admiração por nada que fazia, mas me tolerava, a gente conseguia pelo menos conviver. Quando comecei a transformação do corpo, acho que na mente deles foi como se dali para frente não tivesse mais jeito, estaria perdida para sempre, um ser estranho que eles rejeitavam mesmo. Até acho que meu pai e minha mãe tentaram em um determinado momento aceitar, mas certamente isso foi demais para eles. Não conseguiram lidar com a situação, aliado ao meu irmão que sempre jogou contra, o resultado foi falta de apoio, de incentivo, de participação. Todas as minhas vitórias eram encaradas por eles como coisas estranhas. Um dia me cansei e meio que desisti de todos. Essa minha história é a mesma de grande parte das transexuais, talvez por isso as trajetórias se pareçam tanto.

Essa semana vendo o programa Conexão Repórter no SBT, o assunto foi transexuais e e todo o processo que envolve a transformação do corpo. Ali pude perceber dentre tantos outros detalhes interessantes, porque o programa é muito bem elaborado, que mais uma vez a família pesa na construção de um ser humano.

Foram mostradas duas transexuais, uma mais bem sucedida, a Vivan, que teve o apoio da irmã. É o que sempre digo, às vezes basta um ente da família, não precisa você ter toda ela ao seu favor, mas um mínimo de apoio. E participou do programa a Bruna, que já teve uma vida marcada por muitos tropeços. A Vivian teve o apoio da irmã, a Bruna rejeição da família.

Vendo o depoimento das duas, acho que me identifiquei com a trajetória das duas, porque minha vida é mais bem estruturada hoje em dia como a da Vivian, mas a Bruna passou pelo vício das drogas, pelo submundo, pela autodestruição,  coisa que também já vivi. Os caminhos que cada pessoa segue também depende de uma série de fatores, como a época que a pessoa viveu, de como estava a sociedade, personalidade, não só a família é a culpada de tudo, óbvio.

Entretanto creio que a família é a nossa base é a estrutura da nossa personalidade e por mais esforços que a gente faça para reconstruir o que não foi construído lá nas bases, fica sempre faltando algo, um pedaço, um elo perdido, uma peça que não se encaixa. Fica um vazio que nada preenche, mesmo que a gente faça de tudo para aquilo sanar. É claro que podemos estar bem "apesar de", mas pessoas sem incentivos da família, dificilmente terão um íntimo bem estruturado.

Para quem quiser assistir o programa é muito bom, com transexuais muito bem escolhidas para dar o depoimento, o que foi dito e a nossa realidade. O médico que operou a Vivian foi o mesmo que me operou e aparece no programa. Segue a primeira parte abaixo, mas tem todo o programa no Youtube.




domingo, 14 de abril de 2013

Desvendando mitos sobre transexualidade.

 (foto de Nany People, transexual que admiro)
Eu sei, gente, que tenho falado muito sobre o assunto, mas é que esses posts estão há anos engasgados e preciso escrevê-los, mas podem ficar tranquilos que meu blog não vai rodar só em volta desse assunto para sempre... rs. Existem muitos mitos, pensamentos errados a respeito de nós transexuais e sinto necessidade de esclarecer algumas coisas para quem é leigo no assunto.

Existe muita confusão entre homossexuais, transexuais e travestis. Para a sociedade é tudo uma variação de gay, mas na realidade os três são bem distintos entre si. Hoje vou abordar algumas idéias erradas que fazem de nós transexuais.

1) Transexual é um travesti operado - Definitivamente não! Travestis não anseiam pela cirurgia, não se sentem pertecendo ao sexo oposto ao do seu nascimento. Travestis tem uma identidade social feminina, gostam de serem percebidas como seres femininos, mas não rejeitam o seu sexo, seu órgão sexual é fonte de prazer. Transexuais se sentem no corpo errado, rejeitam absolutamente os seus órgãos sexuais de nascimento e anseiam ardentemente corrigir esse erro. Transexuais detestam serem percebidas pelo sexo de nascimento, travestis não se importam com isso, desde que possa se mostrar como ser feminino. Opere uma travesti e certamente você terá uma pessoa deprimida com risco de suicídio. Opere uma transexual e ela será agradecida por toda vida. Por isso precisamos passar por tantos testes antes da cirurgia, para que os médicos tenham certeza de que somos mesmo transexual.

2) Transexual é um gay que cortou o pênis - Nossa! Como ouvi isso pela minha vida toda e continuo ouvindo hoje em dia. Não, gays não querem se operar, nem mesmo serem vistos como mulher. Gostam de pertencer e serem percebidos pelo sexo que nasceram, mesmo que ajam de forma diversa, uns mais masculinos outros mais femininos. 

3) Transexual é um travesti que se operou para conseguir mais homens - Esse é o pensamento mais errado que existe. Transexuais geralmente tem a sua vida sexual e amorosa muito prejudicada pelo preconceito. Se transformam fisicamente ou aparentemente numa mulher, mas a grande maioria dos homens não as vê desse jeito e rejeitam. Travestis tem um grupo de homens que preferem se relacionar com "mulheres com pênis". Então se fosse para conseguir mais homens, melhor ficar com o pênis, porque tirá-lo, definitivamente não aumenta a quantidade de homens, pelo contrário, diminui.

4) As transexuais só sentem atração por homens - Não! Tive um grupo no Yahoo, que muitas transexuais se inscreveram e grande parte delas é bissexual, e uma outra parte gosta de mulher mesmo. Sei que isso dá uma pirada de 180 graus na mente de qualquer um. Mas se a gente pensar que transexualidade é uma condição ligada ao gênero e não à sexualidade, dá para entender um pouco que seja. A pessoa se sente pertencente ao sexo oposto ao do seu nascimento, mas pode sentir atração por homem, mulher ou pelos dois. Uma coisa é totalmente separada da outra. Mesmo que quase todos, inclusive parte das transexuais, rejeitem totalmente essa idéia. Mas é a real, podem acreditar.

5) A cirurgia de mudança de sexo corta o pênis da transexual - Primeiro que não se fala cirurgia de mudança de sexo, mas cirurgia de transgenitalização, porque sexo de verdade, cromossômico, esse não muda, continuamos sendo XY. Não se amputa o pênis e joga fora, o que se faz é aproveitar todos os tecidos do pênis, com exceção dos testículos que são realmente descartados, e é feita uma cirurgia plástica usando esses tecidos, criando uma vagina,  inclusive preservando a inervação para que os orgasmos sejam mantidos e eles são mantidos

Bom acho que esses são os maiores mitos, talvez os que mais me incomodam, mas existem outros que talvez, oportunamente, ainda comente. E se por algum momento alguém achar que a gente cisma que não gosta do nosso sexo, assim como como alguém não gosta do tipo de cabelo ou outro aspecto do corpo, se imagine por um minuto dentro do corpo do sexo oposto ao da sua mente, não é uma cisma, é algo bem real e imutável. Ninguém seria burro ao ponto de escolher isso para si, não é uma escolha.

domingo, 7 de abril de 2013

A versão verdadeira da questão da minha voz...



É bom poder fazer posts agora que falo de tudo abertamente, parece que tirei um peso virtual das minhas costas... rs. Sei que posts que falam de doença e problemas de saúde são totalmente impopulares, não agradam a maioria e muitos pulam e nem lêem; experiência de blogueira de anos e anos. Mas esse aqui achei que deveria fazer porque muitas pessoas me perguntaram a  respeito assim que abri sobre a transexualidade.

Sim, a cirurgia que fiz na minhas cordas vocais teve tudo a ver com a transexualidade, não foi calo nas cordas vocais, não foi nenhuma doença que apareceu. Apenas eu tinha dois tons de voz, um grave que parecia o Cid Moreira falando e um outro tom mais agudo em falsete, que usava desde da puberdade. O tom grave era forte mas totalmente rejeitado pela minha mente e emoção, aquela voz nunca me traduziu como pessoa. O tom agudo em falsete era aceito pelas minha emoções e mente feminina, mas por ser um tom criado "artificialmente" tinha todos os inconvenientes possíveis, era menos potente, cansava quando falava e com o tempo fui percebendo cada vez mais cansaço ao usá-lo.

Depois de tentar tratamento fonoaudiológico sem sucesso. Descobri um tal médico que todos diziam muito bom num tipo de cirurgia que tornava o tal tom grave, masculino, em um tom agudo, feminino. Muito animada com a idéia, amadureci, coloquei como meta e em maio de 2010, paguei um valor alto pela cirurgia que ocorreu em outro estado, Rio Grande do Sul. 

Só que por algum motivo de um carma que me persegue. A tal técnica não sutiu efeito. O médico abre a garganta com você acordada e manda falar com o tom grave para ver se o procedimento tornou aguda a voz, só que não tornou. Então o médico mandou me anestesiar, dormi e quando acordei o inferno estava instalado. 

Ele me disse que como a técnica não tinha surtido resultado, teve que fazer uma decorticação na corda vocal, sem minha autorização, que no português claro, é tirar a pele da corda vocal para que ela se torne mais fina. Só que isso causou um dano irreversível na corda vocal. Hoje estou processando o médico e blá blá blá, não vou me estender.

Das duas vozes que tinha, restou uma péssima. Hoje em dia minha voz não é audível em ambientes barulhentos, com ruídos, as vezes basta uma música ligada para abafar a minha voz. Enfim, não é uma voz que funcione na grande maioria dos ambientes que a vida nos faz frequentar. E isso me trouxe um prejuízo social grande.

Vamos lá para as frase que ouço quase que diariamente e que me irritam profuuundamente:

- Você está rouca? É gripe?
- Nossa, como você está rouca! 
- Gritou muito? Você tá rouca demais.
- Ahhh, não sua voz não é tão ruim assim quanto você pensa. (quando estou num lugar sem nenhum barulho)

Na internet:

- Ahhh você tá vendo coisa, sua voz não é tão ruim, eu ouvi no vídeo que fez e não acho que é tudo isso! (No vídeo eu estou de cara com o microfone dentro de um quarto fechado sem nenhum ruído)

Quanto as frase que minimizam a questão faço a seguinte pergunta: - Alguém que passou por tudo que passei, inventaria um problema só para fingir que a vida tá pior?  Sinceramente não preciso disso!

Poucas coisas na vida me arrependi de ter feito. Nesse caso sinto uma  imensa e quase insuportável culpa de ter escolhido fazer esse procedimento. Se tivesse ficado quieta no meu canto nada disso estaria acontecendo e estaria com meu falsete que funcionava.

P.S: Há alguns anos atrás, escrevi um livro que conto a história da minha vida. Amigos pessoais e pessoas que se interessaram, leram o livro e todos disseram gostar bastante. Na verdade é a minha história até o momento da transformação. O livro é tipo romance, conta a minha infância, juventude e todo processo autodestrutivo. O personagem principal é masculino e se chama Jeremias. Pretendo escrever a continuação, que seria a fase da transformação do corpo e tudo que isso acarretou, logicamente a personagem seria feminina nesse novo livro. Quem se interessar em ler o livro está publicado em um blog, só clicar no nome abaixo:
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